Vocação é um segredo de Deus sussurrado no coração
da mulher e do homem. Ninguém descobre, totalmente, os mistérios deste segredo,
mas pelo fato de tê-lo ouvido, ousa arriscar tudo. Nele, a certeza da
felicidade não é comunicada. O que é comunicado é o desafio. Sim, o desafio de
doar-se para que outros vivam. Vocação é o desafio de doar-se em comunhão com
Deus para que todos sejam felizes. Por isso, exige fé. Ou você crê que ouviu
este chamado e que ele provém de Deus, ou não tem entusiasmo para se arriscar.
Este entusiasmo é a paixão do vocacionado. Todo vocacionado é um apaixonado
procurando sua paixão nos rostos do mundo inteiro. E servindo-os. Humildade e
paixão são as características de quem ouviu este chamado. Só o humilde serve.
Só serve bem quem serve com paixão. Ninguém é melhor por receber uma vocação
específica, mas pode construir um mundo melhor no cultivo deste segredo. É
nisto que aposta o vocacionado, porque Deus apostou nele, assim como aposta em
cada ser humano.
Segredo é a palavra que estou usando. Talvez ela
diga pouco e não seja tão clara para explicar o que, de fato, é vocação. Será
que estou enrolando? Não, amigos! Estou tentando dizer que vocação não se
explica apenas com os recursos da compreensão humana tecno-científica
pragmática; que se trata de um toque divino no âmago humano; que é um grande
encontro sucedido por muitos outros; que é um caminho humano com olhar no
divino; que é um ato de fé no amor de Deus e no amor humano. Segredo é isto:
algo que alguém contou para alguém e que este outro não poderá dizer. No caso
das relações humanas, não se deve contar a outrem devido a um príncípio ético
fundado na confiança. No caso deste segredo provir de Deus, trata-se de uma
coisa que o sujeito sabe, mas não sabe dizer o que sabe. É como se Deus
revelasse e ocultasse, desse e recolhesse, comunicasse e tornasse apenas seu.
Se é assim, como uma pessoa pode dizer que é
chamada a uma vocação específica e assumir os compromissos desta vocação?
Pergunta astuta! É angustiante não poder estar perto da paixão de nossa vida.
Como fogo que arde e queima, a paixão desmonta o coração e o remodela segundo
quem nos roubou. Mas este calor pode passar e precisa ser cuidado para a chama
não se esvair. Já prestou atenção numa fogueira, certo?! O fogo existe enquanto
alguém sempre cuida. O fogo dura enquanto lhe é acrescentado lenha, enquanto as
brasas são mantidas acessas. A vocação é similar. Sem a relação, esquece-se o
segredo e a importância dele. Cada vez que alguém intensifica sua relação com
Deus, com o outro, vai obtendo clareza de qual lhe é o chamado próprio e
específico. Alguém pode dizer que é chamada a uma vocação específica quando
entendeu que a atmosfera de sua existência está plasmada pelos horizontes de
tal vocação. Que haja outros desejos não contemplados nas propriedades de uma
vocação, é normal, pois toda escolha inclui e exclui
possibilidades. Destarte, o horizonte permanece. Se for ele o que nos instiga
na caminhada, o que não lhe configura, não lhe é essencial. Portanto, não é empecilho para ser feliz, descartar algo que também desejaríamos por causa do anseio
maior. Vocação está dentro deste Maior. Como dissemos, é o horizonte de toda
nossa vida.
Lembrando, ainda, que este segredo pode ser comunicado e aprendido de diversas formas.
Temos relatos muito belos de vocações que nascem em determinado momento, numa
situação específica, num lugar particular. Outras que nasceram de uma
experiência mística, mas também numa situação de indignação ou limite. Porém, o
que importa é o chamado e quem faz isto é Deus. Então,
não é necessário preocupar-me se Deus me chamou com suas próprias palavras,
numa manifestação especial, num momento extraordinário ou se foi me chamando no
decorrer a minha história. Não. Importante é entender o porquê Ele chama. Para
onde me conduz Seu segredo: à vida religiosa, laical, presbiteral, matrimonial?
Para que? Para constituir uma família? Para ser pastor/a de uma comunidade? Para
socorrer os mais necessitados? Para uma consagração que implique castidade,
pobreza, obediência? Para pregar o Evangelho? Para ser missionário em outros
lugares? Se Deus me chama e eu entendo este segredo, então entendi, também,
onde está a minha felicidade e devo fazer de tudo para concretizá-la, pois a
grande vocação da qual participam todas as mulheres e todos os homens é a
santidade. Santidade nada mais é do que a felicidade plena.
Aldevir Jandres
Assistente Espiritual Jufra/RS – OFM Cap.
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